É chamado de Ciclo da Borracha um período da história brasileira na qual a extração de látex para a fabricação de borracha foi uma atividade de suma importância para a economia do país. Esse período ocorreu entre 1879 e 1912, sendo impulsionado pela demanda do produto pelas indústrias europeias e norte-americanas.
As possíveis riquezas geradas pela extração do látex levaram a uma grande migração de pessoas para a região amazônica, onde se localizava a maior parte dos seringais, a árvore de onde é extraído.
Látex desperta interesse
Os índios conheciam as propriedades do látex há muito tempo, mas foi a partir do século XVIII, com a visita do naturalista francês Charles Marie de La Condamine, o primeiro europeu a descrever em detalhes as propriedades da substância, que a borracha começou a chamar a atenção.
O desenvolvimento tecnológico provocado pela segunda Revolução Industrial, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos, criou demandas de muitos produtos feitos à base de borracha, levando a vários estudos e pesquisas com o látex. A descoberta do processo de vulcanização, pelo americano Charles Goodyear, em 1839, permitiu que a borracha pudesse ser produzida em larga escala para atender às necessidades do mercado.
Primeiro ciclo
A exploração da borracha era marcada pela relação entre o seringalista e o seringueiro. O primeiro, dono das terras e dos equipamentos necessários empregava o segundo, responsável pela mão de obra. Em muitos casos, essa relação se assemelhava a uma espécie de escravidão por dívida.
O seringueiro era levado para a região pelo seringalista com a promessa de ganhar muito dinheiro, mas, ao chegar no local, era preciso pagar por viagem alojamento, comida e equipamentos utilizados. Com ganhos baixos e taxas altas a pagar, os trabalhadores ficavam presos ao seringalista em uma dívida praticamente sem fim. Apesar disso, mais e mais pessoas se aventuravam na atividade.
Para os seringalistas, a prática era muito lucrativa. No final do século XIX, o Brasil já era o maior exportador de borracha do mundo. A riqueza gerada foi responsável pelo surgimento de povoados que, mais tarde, se tornaram cidades. Regiões como Manaus e Belém experimentaram um grande desenvolvimento, atraindo pessoas e investimento do exterior.
Compra do Acre
A demanda por mais borracha levava muitos brasileiros a atravessar a fronteira e penetrar em território boliviano para explorar os seringais da região do Acre. Essa prática quase levou a um conflito entre Brasil e Bolívia. A questão foi resolvida de forma diplomática, tendo José Maria da Silva Paranhos, o famoso Barão do Rio Branco, à frente da negociação.
O acordo incluía, em troca do território, um pagamento de, aproximadamente, 2 milhões de libras, a cessão de uma pequena parte do atual estado de Rondônia e a construção da ferrovia Madeira-Mamoré. Essa ferrovia era essencial tanto para o Brasil quanto para a Bolívia, pois ajudaria a escoar a produção de borracha até um porto no Atlântico.
Fim do primeiro ciclo
No início do século XX, empresários ingleses começaram a extrair látex nas colônias britânicas na Ásia. O processo de produção utilizado por eles era muito mais eficiente, proporcionando uma redução nos custos de produção. Consequentemente, o custo da borracha também foi reduzido, puxando o preço do produto produzido no mundo para baixo. Em pouco tempo, já dominavam o mercado mundial.
A concorrência inglesa tornou a extração do látex brasileiro inviável, levando à decadência de todo o processo e à estagnação da economia da região. As cidades pararam de crescer, barões faliram e o desemprego explodiu. Até a ferrovia Madeira-Mamoré, recém-inaugurada, começava a se tornar obsoleta. A ferrovia seria desativada parcialmente em 1930, e, de forma definitiva, em 1972.
O curioso é que as sementes plantadas pelos ingleses haviam sido contrabandeadas do Brasil, por volta de 1870.
Segundo ciclo
Em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, as forças japonesas conquistaram vários territórios no Pacífico Sul, interrompendo a produção de borracha nas colônias inglesas. O governo brasileiro negociava, naquele momento, um acordo de apoio aos Estados Unidos na guerra, comprometendo-se a fornecer material essencial para o esforço de guerra.
Dessa forma, aproveitou a ocasião para tentar retomar a produção de borracha na Amazônia.
Soldados da borracha
Para cumprir o acordo, e entregar a quantidade de borracha necessária, o governo brasileiro convocou trabalhadores para trabalhar nos seringais. Mais de 100 mil pessoas, principalmente do Nordeste, dirigiram-se para a região. Esses trabalhadores ficaram conhecidos como os “soldados da borracha”, pois o esforço deles era tão importante quanto o esforço dos próprios soldados em combate.
Nesse período, foi criado, pelo governo brasileiro, o Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para a Amazônia (SEMTA). Os trabalhadores assinavam um contrato com a SEMTA, que previa um valor pela viagem e um salário equivalente a 60% do que fosse obtido na extração da borracha.
As condições de trabalho as quais foram submetidos esses seringueiros eram extremas. Foram vítimas de várias doenças, tais como malária, febre amarela, hepatite, além de picadas de cobras e escorpiões, em muitos casos, fatais. Estima-se que mais de 30 mil tenham morrido.
Com o fim da guerra, muitos trabalhadores foram abandonados na região, sem conseguir voltar para casa, tampouco as promessas do governo de uma aposentadoria equiparada à dos militares foram cumpridas.
O surgimento de borracha sintética após a Segunda Guerra acabou de vez com a produção em larga escala. O Ciclo da Borracha gerou riqueza e desenvolvimento, mas também trouxe sofrimento para os trabalhadores, e mostrou a ineficácia dos governos locais e federal em pensar estratégias de desenvolvimento a longo prazo para a região.