Fazer compras na Rua 25 de Março, em São Paulo, ou no Saara, no Rio de Janeiro, é algo bastante comum, não é mesmo? Ambos os locais viraram pontos turísticos do comércio popular.
Outro lugar muito famoso, mas fora do Brasil, é a Ciudad del Este, no Paraguai, na fronteira com Foz do Iguaçu, no Paraná. Só que esses três pontos têm mais em comum do que meros pontos comerciais. Neles ocorre a venda indiscriminada dos produtos chamados piratas, isto é, imitações do original fabricadas em uma qualidade menor e oferecidos a preços mais baratos.
Ocorre que o comércio desse tipo de mercadoria causa um impacto gigantesco não apenas para as empresas e o governo, mas também para o consumidor, que não tem a segurança de um conteúdo de boa procedência. Por outro lado, as pessoas não querem ficar fora do consumo tão estimulado no capitalismo. Esse dilema é uma das características dos dias atuais.
O que é pirataria e a questão do consumo?
Como se sabe, o Código Penal tipifica a pirataria como crime e pode dar cadeia. Isso pode ocorrer caso haja qualquer tipo de reprodução, parcial ou total, do trabalho de outro indivíduo com o objetivo de conseguir lucro, sem que haja autorização expressa do autor daquela obra.
É possível piratear sapatos, roupas, brinquedos, perfumes, bebidas, cigarros, peças de carro, instrumentos cirúrgicos, medicamentos, etc. No entanto, por trás da lei e de toda a campanha antipirataria, há a crescente necessidade de consumo instaurada pela própria sociedade capitalista, que, ao mesmo tempo em que incentiva todos a entrarem nesse circuito, não provê aos indivíduos uma renda possível para satisfazer seus desejos e suas vontades.
Isso faz com que muitos recorram a imitações ou produtos de qualidade inferior para economizar no valor e ter acesso àquilo que faz com que se sinta bem em relação aos demais ao seu redor.
Em entrevista à revista Ponto Com, o antropólogo Gustavo Lins Ribeiro, da Universidade de Brasília (UNB), afirma que esse mercado global criou uma globalização popular com pessoas que, em tese, estão à margem da sociedade, caso dos sacoleiros, mas que produzem impacto no comércio e no consumo das mercadorias. E, claro, acaba afetando até mesmo a pirataria. No entanto, ele coloca que não é correto atrelar o sacoleiro ao crime organizado, como é recorrente pela sociedade.
“O problema central é que as economias formais não conseguem gerar pleno emprego, obrigando as pessoas a recorrerem a atividades que são perseguidas pelo Estado, uma vez que violam aquilo que há de básico para sua existência: a capacidade de extrair impostos”, defende, justificando o crescimento desse comércio também pela necessidade de as pessoas trabalharem.
Dados no Brasil e no mundo
Relatório divulgado por MUSO, consultora britânica que rastreia a pirataria na internet, aponta que o Brasil é o quarto país do ranking daqueles que mais consome conteúdo ilegal em todo o mundo. Aqui vale livros, revistas, notícias, material televisivo, etc.
Mas, apesar de estar na parte de cima do ranking do estudo divulgado em 2017, o Brasil está longe do campeão Estados Unidos, que consome mais que o dobro de conteúdo pirateado em terras tupiniquins.
O impacto financeiro da pirataria é grande. Dados do Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade (FNCP) apontam que o Brasil tem um prejuízo anual de R$115 bilhões, devido à sonegação fiscal proveniente da pirataria.
O estudo mostra ainda que esse prejuízo afeta tanto o setor público quanto o privado. No mundo, esses números também são altos. Para se ter uma ideia, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) destaca que o comércio de produtos piratas movimentou US$461 bilhões em todo o planeta.
Consequências da pirataria
A comercialização de produtos falsificados gera uma série de outros crimes, como tributários, aduaneiros e também contra a ordem econômica. E o impacto disso recai diretamente na retenção dos impostos, que também diminui, já que os itens pirateados são vendidos e consumidos sem taxas.
Isso pode afetar o lojista, que perde competividade, já que ele precisa pagar os tributos e seguir toda a legislação e burocracia da sociedade, além do próprio Estado, que arrecada menos e, com isso, tem menos verba para investir em educação, saúde, segurança, etc. Até mesmo o consumidor pode sofrer as consequências de adquirir mercadorias de procedência inferior, sem teste de qualidade, por exemplo.
Outra consequência apontada por especialistas é a redução da geração de empregos, pois, com menos dinheiro arrecadado pelos vendedores na comercialização de seus produtos, há menos condições para ofertar novas oportunidades de trabalho. Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) garantem que a pirataria no Brasil impede a geração de 1,5 milhões de empregos todos os anos.
Métodos de combate
O Brasil tem uma série de medidas que visam combater a pirataria. Além do que está no Código Penal, a CPI da Pirataria, finalizada em 2004, propôs a criação de um órgão público de inteligência para articular e implantar políticas públicas que ajudassem no combate à pirataria.
Segundo o Ministério da Justiça, esse órgão reuniu poder público, sociedade civil e atores prejudicados pela pirataria, promovendo discussões e projetos que culminaram em 99 ações concretas de combate à pirataria.
Tais sugestões nortearam as ações do ministério a partir da década passada e possibilitaram que a Receita Federal, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal realizassem inúmeras apreensões.
Há medidas que podem ser incentivadas pelos comerciantes, por exemplo, ensinar o público a identificar versões falsificadas do produto e sempre usar código de barra nos seus itens.
Além disso, fidelizar o cliente, aprimorar o produto, suas ofertas e oferecer vantagens ao cliente, para que ele se sinta atraído a comprar a sua mercadoria, ainda que o item seja um pouco mais caro. Valorizar o que se vende e também o cliente são passos positivos no sentido de evitar perdas em relação à concorrência e à pirataria.