A ditadura do proletariado foi um termo cunhado pelos alemães Karl Marx (1818 – 1883) e Friedrich Engels (1820 – 1895) para tentar teorizar como deveria se organizar a classe trabalhadora após a derrubada do Estado burguês. Defendido e implantado pelo revolucionário russo Vladimir Lênin (1870 – 1924) na Revolução Russa de 1917, a ditadura do proletariado se coloca como um Estado temporário durante a transição do sistema capitalista para o comunista.
Muito comentada por acadêmicos e intelectuais, o termo é visto com ceticismo e temor por leigos, que imaginam a implantação de uma ditadura de fato e o cerceamento das liberdades. Vamos tentar mostrar, neste artigo, que, apesar da palavra, o termo revela uma forma de governo específica e transitória, explicando o seu papel dentro da revolução comunista. Vamos abordar, ainda, as diferenças do conceito entre Lênin e a polonesa Rosa Luxemburgo (1871 – 1919), esta que divergia da forma como o revolucionário russo adaptava a tese marxista.
O papel da ditadura do proletariado até o comunismo
De acordo com Marx, a luta entre as classes sociais levaria inevitavelmente à ditadura do proletariado, que se constituía somente como uma etapa antecedente à abolição de todas as classes e a instauração do comunismo. Sendo assim, a ditadura do proletariado seria um período transitório que ocorreria logo após a queda do Estado burguês.
Nesse intervalo seria necessário o esmagamento da classe até então dominante, sobressaindo os trabalhadores, que se tornariam hegemônicos e acabariam com todo e qualquer traço burguês.
Ou seja, a ditadura do proletariado seria responsável por desmontar com o Estado capitalista e deixar nas mãos da classe operária todas as tarefas feitas até então pelo Estado burguês. Nessa etapa, seriam subtraídas a burocracia, a polícia e o exército e seriam colocados os pilares da nova era comunista. No entanto, esse poder não deve ser confundido com uma ditadura exercida sobre a maioria do povo, mas sim em cima da minoria expropriadora.
É importante salientar que, de acordo com o movimento internacional comunista, a ditadura do proletariado seria um Estado apenas e tão somente nesse período de transição, visando reprimir com violência a resistência da classe que tentar resistir ao poder operário.
“Decorre de sua própria concepção que o regime da ditadura do proletariado deixa de ser o de um estado, no sentido tradicional da palavra, isto é, uma máquina construída para manter a maioria da população subserviente. Juntamente com as armas, a força material passa diretamente, imediatamente, para as mãos de organizações dos trabalhadores, tais como os sovietes”, afirma o texto Democracia socialista e ditadura do proletariado, proposto pela IV Internacional Comunista.
E depois da revolução? Debates e a experiência do socialismo real
Uma discussão muito premente era com relação ao que deveria acontecer após a tomada do poder pelos trabalhadores e a implantação da ditadura do proletariado. Segundo Marx, esse período transitório deveria ser substituído pelo comunismo de maneira natural, em que a sociedade sem classes deixaria de ser uma utopia após a inversão da opressão e dos dominados. Só que alguns autores trouxeram outras linhas de pensamento e a própria prática mostrou alternativas diferentes das teorias marxistas.
Basicamente, as discussões se dividiram em duas grandes correntes: a de Lênin e a de Rosa Luxemburgo. O primeiro defendia que a revolução deveria ser conduzida e organizada por uma vanguarda revolucionária profissional, isto é, um partido deveria comandar a ditadura do proletariado e levar a nação rumo ao comunismo. Essa tese centralizadora foi a base da atuação dos bolcheviques na revolução de 1917 na Rússia.
Já Luxemburgo criticava o argumento leninista, pois uma revolução sob a liderança de um partido seria, na visão dela, antidemocrática, por não levar em conta a classe trabalhadora como agente desse processo. Ela propunha uma revolução atrelada à espontaneidade da classe proletária, que saberia o que fazer e quando agir.
Na prática, o que se viu foi a vitória da tese de Lênin, pois na Rússia, que virou União Soviética, e até mesmo na ilha de Cuba, o que predominou foi a forte mão do Estado sobre os meios de produção, levando ao que se convencionou chamar de “socialismo real”, ou “socialismo possível”, já que poderia ser argumentado que foi o que se conseguiu – diante das circunstâncias da época e também dos contra-ataques do capitalismo mundial – a tese do “socialismo em um só país”, do ditador soviético Josef Stálin (1878 – 1953), prevalecendo à ideia inicial de revolução internacional.
Vale dizer, por fim, que o “socialismo real” ficou distante não só de Rosa Luxemburgo, como também de Lênin e até de Marx e Engels, já que esse sistema não avançou para uma sociedade comunista e sem classes, interrompendo a revolução na etapa do Estado, que permaneceu no controle das riquezas e com o monopólio da violência, sem que os trabalhadores ficassem no poder, que foi para as mãos de uma burocracia operária e estatal, forjando, assim, uma nova elite.